quarta-feira, 9 de abril de 2014

CRÍTICA DOCUMENTÁRIO/É TUDO VERDADE: Filme expõe inquietações permanentes do jornalismo


O DIRETOR JORGE FURTADO CRITICA REPORTAGENS E FAZ UM ÁCIDO PAINEL DA PRODUÇÃO DE NOTÍCIAS
ELEONORA DE LUCENADE SÃO PAULO
Para que serve o jornalismo? Quais são os interesses subterrâneos numa notícia? Existe a tal neutralidade? Qual o poder da publicidade nos veículos? A internet vai acabar com os jornais impressos? Qual a força dos blogs?
Inquietações permanentes e dúvidas mais recentes sobre o jornalismo são o foco de "O Mercado de Notícias", documentário de Jorge Furtado. Para tratar do tema, ele colheu depoimentos de 13 jornalistas e encenou uma peça teatral de 1625.
A comédia "The Staple of News" [o mercado de notícias, em tradução livre] é do dramaturgo inglês Ben Jonson (1572-1637), contemporâneo de William Shakespeare. Aborda com ironia o jornalismo, exposto como um negócio no nascente capitalismo.
Cenas dessa sátira servem de fio condutor e são intercaladas por entrevistas com jornalistas como Janio de Freitas, Mino Carta, Luis Nassif, Geneton Moraes Neto, Fernando Rodrigues, Raimundo Pereira e Renata Lo Prete.
Ética, inclinações políticas, interesses empresariais, falhas de apuração, erros: vários são os pontos analisados pelos profissionais. O cineasta critica reportagens, inclusive da Folha. O resultado é um ácido painel da produção de notícias, um reconhecimento das limitações e dos desafios da profissão.
Os depoimentos percorrem temas como relações entre repórteres e fontes de informação, pressões políticas e de editores, arrogâncias, sensacionalismos, afoitezas, distorções de edição.
Furtado pincela alguns tópicos da história geral do jornalismo, mas seu alvo são as vicissitudes atuais, que, de resto, expõem as questões de fundo que movem o trabalho.
Rapidamente, o documentário fala da imprensa antes do golpe de 1964 --quando os jornais tinham nítidas colorações políticas-- e da sua adesão ao regime ditatorial.
Entrevistados enxergam hoje em posições da mídia contra o governo do PT um inconformismo das elites e uma expressão da luta de classes. Entra no debate o conceito de Millôr Fernandes, para quem jornalismo é oposição; o resto é armazém de secos e molhados.
A força dos anúncios nos meios também é enfocada. De um lado, aparecem críticas ao uso da publicidade oficial. De outro, surge o argumento de que, como empresas capitalistas, os jornais são editados essencialmente para conter publicidade.
A discussão sobre o impacto da internet fica em aberto: ninguém se arrisca a fazer previsões firmes sobre modelos de negócios e novas fórmulas de cobertura. Janio de Freitas afirma: "A culpa está nos jornais, não na internet". Para ele, "o jornalismo depende dos jornalistas".
Folha, 09.04.2014

 
www.abraao.com


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